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sábado, 24 de maio de 2014

NADISMO

                
                   No século XIX um grupo de filósofos europeus anunciou a morte de Deus; a este anúncio seguiu-se o niilismo, uma espécie de sensação de vazio que na literatura de Jean-Paul Sartre foi comparada a uma espécie de náusea. Eles expulsaram Deus do mundo e nada colocaram no lugar!
                A “morte de Deus” gerou um pensamento cáustico, cético, ancorado mais na linguagem do que na realidade do ser, uma fala para desconstruir, uma “vocação para a heresia”. Michel Focault, Nietzsche e Sartre são frutos mais ou menos tardios desse vazio pós-moderno que parece impossível de ser curado.
                Contudo, o vazio niilista que começou no século XIX e se estendeu pelo século XX não se compara nem de longe com a sensação de vácuo existencial desse início de século XXI que eu batizei de nadismo. O nadismo é uma sensação resignada do nada; ao contrário do vazio niilista que quer ser preenchido, o nadismo é a condição final, é a própria essência da não existência significativa.
                Um indivíduo alcançado pelo vazio niilista procura algo que o complete, seja no âmbito da religião, do entretenimento ou de qualquer outra coisa, já o nadista (é assim que eu chamo a pessoa atingida pelo nadismo) não está buscando nada, apenas subsiste e convive com a sua estrutura oca de sentido sem se preocupar com isso.
                O nadista é um autômato incapaz de pensamentos e abstrações relevantes, o máximo que faz é consumir. Aliás, o nadista é um ensimesmado, fechou-se em sua própria existência e aferrou-se aos seus próprios interesses efêmeros. Ele é semelhante a um bicho que se contenta apenas com um prato cheio de ração e umas voltinhas no quarteirão.
                O nadista é um típico representante da sociedade do espetáculo e do consumo, ele se alimenta dos breves momentos de celebridade que goza nas redes sociais e dos objetos de marca que adquire com sangue, suor e lágrimas. Os seus projetos são sempre condicionados pelo materialismo e mesmo se um dia tornar-se célebre e conhecido mergulhará cada vez mais no nada.
                O nadismo é como um poço fundo no qual uma vez tendo nele mergulhado, dificilmente será possível voltar a superfície para respirar e manter-se vivo. O nadismo gera no indivíduo um sutil desinteresse por tudo o que é reflexão e vincula-o a uma atitude patológica de passividade que só o permite viver o presente imediato.
                Na verdade, o nadista não é um desinteressado por tudo, apenas interessa-se superficialmente por todas as coisas sem nunca chegar a conhecer coisa alguma. O nadista nada tem a dizer sobre o presente e nada a acreditar no futuro; ele é como um passageiro deprimido que toma um ônibus sem procurar saber o seu destino.
                O típico nadista é uma aberração psíquica ambulante, é o não-ser de carne e osso, é o nada sobre duas pernas. O nadismo é pior dos males que pode atingir um ser humano, ele é irmão do relativismo, é a doença do não sonhar as utopias. Antes tínhamos os pés fora do chão, agora eles não estão em lugar algum, eles nem mesmo existem!

                                                                                                                             André Pessoa

Um comentário:

  1. esse nadismo tem cura, é só ir numa sessão espírita de invocação que, quando começar a ficar tenso num instante acaba essa viadage kkkk

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