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sábado, 17 de agosto de 2013



O TEMPLO EM CHAMAS



                 
             As últimas notícias que estão chegando do Egito preocupam o mundo e mostram que a violência ainda continua sendo a forma mais utilizada por aqueles que não conseguem chegar a um acordo quanto as suas diferenças. Na quarta-feira passada, 14 de agosto, pelo menos 640 manifestantes que apóiam o presidente deposto do Egito, Mohammed Morsi, foram violentamente assassinados por tropas da polícia e do exército egípcio.  

                A hostilidade, o impasse e o “tempero” religioso do conflito parecem sugerir que o banho de sangue só está começando e que talvez o Egito se transforme em uma nova Síria. As imagens e fotos do conflito da última quarta-feira no Egito veiculadas na internet não deixam dúvida da violência dos acontecimentos e talvez indiquem o início de uma longa guerra civil.

                Mohammed Morsi foi eleito de forma considerada legítima nas eleições presidenciais de 2012 depois da deposição do até então ditador Hosni Mubarak. Morsi, representante do braço político da Irmandade Muçulmana, desentendeu-se com certos setores institucionais e recebeu um ultimato do exército afim de que abandonasse o cargo.

                Com a saída de Morsi, Adly Mansou, líder da Suprema Corte, apoiado pelo exército, subiu interinamente ao poder prometendo uma nova eleição para o início de 2014. A Irmandade Muçulmana e outros setores da sociedade que apoiavam Morsi não aceitaram a proposta e foi às ruas protestar.

                Acampamentos de apoiadores de Morsi foram erguidos em praças e ao redor da mesquita de Al-Adawiya no Cairo com a finalidade de pressionar o governo e garantir a volta de Morsi ao poder. No último dia 14 de agosto, quarta-feira, tropas da polícia e do exército receberam ordens para desmontar os acampamentos e  dispersar a multidão.

                Homens armados munidos de escavadeiras arrastaram tudo o que viram pela frente e abriram fogo contra os obstinados manifestantes que foram mortos impiedosamente (fala-se em 640 mortos só na quarta-feira). Hospitais improvisados em mesquitas tentavam cuidar dos feridos que eram colocados ao lado de centenas de cadáveres que iam chegando. Uma tragédia!

                Deixando de lado o caráter jornalístico deste texto, mergulhemos no sentido de tudo isso começando por responder a uma importante pergunta: O que significa toda essa violência? O conflito no Egito é apenas mais um dos muitos que se iniciaram com a chamada “primavera árabe”. Entre outras características desse grupo de conflitos que foi “batizado” com o doce nome acima, destaca-se uma tendência ao laicismo.

                No Egito, por exemplo, não foi nenhum grupo religioso em especial que depôs Mubarak, mas uma sociedade que parecia cansada das ditaduras sejam elas de fundamento religioso ou não. Ao que tudo indicava o Egito não queria  ser governado por um ditador e nem tampouco por algum tipo exótico de xeque que tivesse como referência o Corão e abominasse as “delícias” do mundo ocidental.  

                O oriente e outras partes do mundo como o nordeste da África, onde fica o Egito, pareciam estar dispostos a adotar uma cultura menos religiosa e mais laica que permitisse vôos mais altos na direção do consumismo e da sensualidade tão comuns no mundo ocidental. Por trás das palavras de ordem gritadas nos protestos durante a Primavera Árabe havia uma vontade não declarada de ingressar no universo da Mcdonalds.

                Talvez por esse motivo, a eleição de Morsi e a nomeação de líderes muçulmanos para importantes cargos políticos tenha sido rejeitada pelas forças armadas que até então pareciam representar a “civilização”. Entretanto, como supôs em um dos seus livros o escritor britânico George Orwell, é com muita facilidade que o oprimido se torna opressor.

                No Egito, grupos militares preteridos por Morsi e sedentos de poder, em nome de uma “tendência laica civilizada” tomaram o poder e estão massacrando de forma bárbara aqueles que se afirmava serem bárbaros incivilizados e fanáticos religiosos. Afinal de contas, quem de fato é bárbaro e fanático nessa história? Difícil dizer.

                De todas as cenas que vi nos últimos dias no Egito, uma preocupou-me porque parece ser o símbolo do que virá: uma mesquita incendiada e com as paredes chamuscadas pelo fogo e pela força da artilharia. Os templos queimados sempre representaram ao longo da História uma de duas coisas: ou o fim de uma religião ou começo de uma guerra sangrenta.

                                                                                                                                             André Pessoa

               

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