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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013


FAVELAS QUE VALEM OURO


            
          Um fato que tem atraído bastante a minha atenção nos últimos meses é a transformação de favelas do Rio de Janeiro em pontos turísticos. Acredite se quiser, é possível fazer um tour por alguns morros do Rio e dá uma olhadinha na paisagem enquanto se anda de teleférico.
            O lugar de horror e de violência está sendo transformado em empreendimento capitalista e as balas perdidas vão se tornando cada vez mais raras enquanto as UPPs se tornam bastante comuns. Foi só depois de ler o esplêndido texto intitulado “favelas pacificadas para a nova burguesia brasileira” que entendi melhor o fenômeno.
            O texto acima citado é de Jacques Denis e compõe a edição de janeiro de 2013 do Le Monde Diplomatique. No artigo em questão, Denis, citando a revista Veja, diz que os preços aumentaram 28% no entorno das UPPs do Morro pacificado do Vidigal. É a pacificação gerando lucro!
            O mesmo jornalista diz que a pacificação tem como finalidade preparar o caminho para uma grande regularização imobiliária que facilitará a especulação em uma área que se tornará promissora. Agora fica mais clara a razão da transformação das favelas em pontos turísticos e em complexos culturais.
            Artistas famosos, celebridades de todos os quilates e pesquisadores estão fazendo do morro a sua morada; talvez antevendo a transformação capitalista daquilo que já foi um dia a “terra de ninguém”. Vai-se o narcotráfico, fica a possibilidade de exploração comercial!
            Além da óbvia especulação imobiliária que está sendo planejada pelas mentes clarividentes do mundo do capital, há uma coisa que me incomoda: existe de fato um verdadeiro potencial turístico em uma favela? Penso que só admitindo que a miséria e o crescimento urbano desordenado sejam atraentes se diria que sim.
            Outra pergunta: o que vai procurar um turista em um morro do Rio de Janeiro? Não me entendam mal. Claro que eu sei que ali existem pessoas boas, honestas e que produzem cultura. Mas será que isso é suficiente para atrair turistas que se hospedam em pousadas que em breve serão ladeadas por restaurantes com comida francesa?
            Acredito que não. Talvez, além da especulação imobiliária e do projeto de modernização do Rio de Janeiro que atrairá a cobiça dos empresários sobre as favelas, haja outra razão para a transformação da favela em ponto turístico: Trata-se da comercialização da memória do crime!
            Certamente não existe um só turista estrangeiro ou brasileiro que ao flutuar por cima do emaranhado desordenado de ruas e casas dos morros do Rio em um teleférico não “viaje” no passado e não chegue quase a escutar o estrondar dos tiros de fuzil que ali já se fizeram ouvir. É isso mesmo!
            As favelas despertarão nos turistas uma memória penetrante e rica em imagens que os fará viajar no passado violento das comunidades. Às suas mentes sedentas por experiências-limite e exotismo, virão às operações policiais, a ostentação dos traficantes e os muitos atos de violência brutal cometidos impunemente.
            Nesse sublime momento, a violência tantas vezes vistas nos noticiários da TV, e agora esteticamente transformada em entretenimento, reviverá em forma de lembrança. De fato, há no capitalismo algo de alquimia. Se não fosse assim, tudo o que ele tocasse não viraria ouro!
                                                                                                 
André Pessoa     

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