Todas as tentativas de resgatar a
imagem do Jesus histórico só geraram até hoje bizarrices e caricaturas
grosseiras. Há algo de irrecuperável na figura histórica de Jesus Cristo que
impede qualquer tipo de representação desse notável Galileu que tem atravessado
séculos envolto em uma nuvem de mistérios.
O Jesus
ariano do catolicismo, o Cristo gnóstico dos hippies ou o “homem de branco” das
igrejas evangélicas neopentecostais, são caricaturas risíveis. A esse exército
de cristos deformados muitos outros ainda serão acrescentados até que a lista
se esgote.
O último com
o qual me deparei e que me fez sorrir meio nauseado e reafirmar o meu desprezo
por essas imagens medonhas, foi o “Jesus espírita” do comercial da Paixão de
Cristo de Nova Jerusalém. Nunca vi mais tosco, apesar da tentativa bem
intencionada de apresentar um Jesus próximo da realidade.
Não se
apressem em me criticar caros amigos kardecistas, o termo “Jesus espírita” foi
só força de expressão. O Cristo do comercial da Paixão de Cristo de Nova
Jerusalém é na verdade uma mistura burguesa de baixo candomblé com
curandeirismo de quinta categoria.
A cena que
se desenrola no comercial é pitoresca e nauseante ao mesmo tempo. O Jesus em
questão coloca as mãos no rosto de um cego, invoca sei lá o quê, e depois de um
quase ataque epilético faz um movimento parecido com as performances do Freddie
Mercury no Rock in Rio e o cego é milagrosamente curado.
Nem mesmo o
mais inocente dos cristãos de carteirinha se emociona com essa cena patética.
Depois de passar anos errando o alvo ao escolher o ator que deveria representar
Jesus, a Paixão de Cristo de Nova Jerusalém agora se equivocou nas cenas que
reproduzem as narrativas dos evangelhos.
Primeiro foi
o Tiago Lacerda (um Jesus bonitão global), depois outros cristos mais regionais
(e menos globais) e agora resolveram retratar uma espécie de curandeiro da
caatinga. Achei que isso nunca ia acontecer, mas estou com saudades do José
Pimentel!
Para ser
mais justo, devo admitir que talvez a culpa não fosse de quem escreveu o texto,
mas da própria impossibilidade de recuperar a figura do Jesus histórico. Perdemos
Jesus para sempre e nem mesmo procurando-o atrás de cada arbusto do agreste
pernambucano haveremos de encontrá-lo.
Aliás,
minto, não o perdemos, simplesmente nunca o achamos. Os cristos dessas
interpretações equivocadas dos evangelhos nada mais são do que uma quimera
produzida por mentes imaginosas que na ânsia de transformá-lo em um produto
hollywoodiano de consumo, afastam-se dele cada vez mais dele.
Esse Jesus
que faz milagres com jeito de quem está dando um show, nunca existiu no mundo
real, mas trata-se apenas da projeção de um delírio alimentado pelo imaginário
do senso comum. Não passa de uma mistificação desvinculada do mundo concreto.
Tudo isso,
porém, aponta para algo que está por trás das grandes mistificações: a
necessidade que as pessoas possuem de consumirem coisas exóticas e
extraordinárias. Esse Cristo circense cheio de trejeitos e performances
teatrais nunca pisou no chão do nosso planeta, mas cresce livre no solo fértil
das fantasias.
André Pessoa
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