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quarta-feira, 14 de novembro de 2012


HOMEM CORDIAL, CONDUTA ILEGAL

              
                    Faltam vinte minutos para as seis horas da manhã e eu estou indo para o trabalho. No percurso paro em um semáforo e observo sem muito alarde oito veículos, entre carros e motocicletas, avançarem sem cerimônia o sinal e seguirem apressados me deixando para trás.
               Apesar de já estar relativamente acostumado com os constantes avanços de sinal que presencio todos os dias enquanto dirijo, ainda me causa uma ponta de perplexidade ver tanta gente ao mesmo tempo transgredindo a lei. A ilegalidade é quase legal no Brasil!
               Não há qualquer tipo de pudor nos motoristas e nem qualquer resquício de respeito às leis e aos pedestres. A maioria esmagadora dos motoristas desobedece às leis de trânsito sem  remorso algum transformando as condutas ilegais em norma.
               Outro dia fui surpreendido pela buzina estridente de um automóvel parado atrás de mim que reclamava o fato de eu não ter avançado um sinal de pedestres que estava vermelho embora não houvesse ninguém atravessando a via. A melhor forma de aprender a cumprir a lei é cumprindo-a.
               Quando comento esses acontecimentos lembro-me daquilo que Sérgio Buarque de Holanda, historiador da geração de 30, disse acerca da nossa identidade sociocultural. Em seu livro “Raízes do Brasil”, o erudito pensador utiliza o termo “homem cordial” para se referir ao brasileiro.
               Segundo esse importante catedrático, as relações estabelecidas pelo homem brasileiro caracterizam-se pela afetividade o que torna a nossa população refratária à impessoalidade das leis. Ou seja, o brasileiro adota posturas informais que o indispõe às regras e normas necessárias ao convívio social e a ordem pública.
               O brasileiro na visão de Sérgio Buarque está pronto a agir movido pelas suas emoções e interesses imediatos deixando de lado o respeito pelo que é público. Essa “cordialidade” do brasileiro, que nada tem que ver com algo respeitável, introduz o homem comum no mundo da ignorância transgressora.
               Algo que seria cômico   -   caso não fosse absurdo  -  é o fato de alguns motoristas desavisados suporem que a transgressão da lei é aceitável em algumas circunstâncias e sob certas condições. Por exemplo: uma pessoa acredita que pode estacionar em local proibido desde que deixe o pisca-alerta do veículo ligado.
               Os mais cínicos chegam a levantar a tampa do motor do carro para simular um eventual problema mecânico que nunca existiu e que servirá de pretexto para infringir a lei. O famoso “jeitinho” brasileiro e a conduta ilegal andam de mãos dadas e contribuem para perpetuar a desordem.
               Não é de admirar que os departamentos de trânsito apliquem a cada dia mais e mais multas penalizando os infratores que parecem indiferentes a lei, mas que reagem insatisfeitos quando sentem “no bolso” o preço da ilegalidade. Não há país desenvolvido sem respeito às leis; nesse caso é preciso deixar de ser cordial.
                                                                                                                                     André Pessoa
                 
               

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