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sábado, 16 de maio de 2009

O QUE ESTÁ ACONTECENDO COM O MUNDO?



O QUE ESTÁ ACONTECENDO COM O MUNDO?



Ursos polares comendo lixo no Canadá, as cidades litorâneas sendo engolidas pelo mar, refugiados ambientais e um presidente negro de ascendência muçulmana a frente dos Estados Unidos, nação onde até bem pouco tempo atrás surgiram organizações como a famigerada Ku Klus Klan. Fatos relacionados entre si que se conjugam para compor uma cena universal que ainda não conseguimos enxergar direito.
Algo está acontecendo, sendo tramado nos bastidores do mundo, mas o quê? O que está acontecendo com o planeta, com a natureza, com a política, com a economia, com a religião e com os seres humanos?
Sinto que o mundo está entregue a um mórbido sentimento de expectativa como se algo que não sabemos exatamente o que é estivesse prestes a acontecer. Estamos diante do desconhecido e isso nos inerva, nos transtorna a alma porque temos consciência de que não estamos mais no controle das coisas (parece que o piloto automático do planeta assumiu o comando e está nos levando para onde não queremos ir).
Essa semana um amigo me disse que cada vez que assiste o noticiário da TV tem a impressão de que algo lhe está sendo ocultado, não anunciado, escondido a todo custo. “Alguém sabe de alguma coisa que eu não sei”, disse-me com ar de desconfiado e jeito de esquizofrênico.
Contudo ainda não podemos dizer quase nada porque por enquanto só vemos sombras se movimentando nas paredes úmidas da caverna como no mito socrático. Disso provém a angústia que está estampada na face de qualquer um com quem cruzamos nas ruas (a incerteza está no ar!).
Uma coisa, porém, nós sabemos: estamos deixando para trás um mundo e entrando em outro que não conhecemos. A crise mundial do capitalismo é a crise do estranhamento, da adaptação, do ingresso numa nova realidade. Tornamo-nos estranhos no nosso próprio mundo, na nossa própria casa, somos forasteiros em nosso próprio lar.
Há um mórbido e doentio silêncio no ar. Mas não é o silêncio da paz, da contemplação, aquele que nos faz ouvir o canto dos pássaros e a voz de Deus, é o silêncio da morte, da expectativa medonha, do presságio, aquele que os videntes do mundo antigo julgavam ser mensageiro de incontáveis desgraças.
De repente os fatos políticos perderam a relevância, a economia ficou indefinida, as armas ficaram roucas, os relatórios não dizem nada, os tiranos silenciaram e as ações imperialistas concretas perderam a razão de ser. Um nada angustiante está se espalhando em todos os lugares como uma excrescência podre e inodora que escorre penetrando todos os espaços e mentes.
Envolvidos que somos por uma espécie de solidariedade psíquica universal, os maus estares de uns afetam os outros que estão à milhas de distância em algum lugar além do oceano. Os seres humanos, não esqueçamos, são personagens que compõem os atos de uma mesma trama global.
A verdade é que já não temos mais a guerra fria, o mundo bipolar (e sim a bipolaridade das pessoas), algum ditador do oriente médio para acusar de fabricante de armas químicas ou um terrorista milionário saudita para caçar nas regiões desérticas do Afeganistão (ou temos?). Todos sumiram repentinamente: o que aconteceu? Não estavam aqui agora mesmo?
Quando testemunhamos o aparecimento e desaparecimento repentino de figuras como as citadas no parágrafo anterior temos a sensação de que a história do mundo está sendo composta por um escritor acomodado confortavelmente no seu escritório dando vida e extinguindo os personagens de acordo com o seu bel prazer e com os efeitos que objetiva produzir.
Do ponto de vista ético e filosófico os paradigmas foram todos quebrados e com eles desapareceram também todas as certezas. A física quântica e o princípio da indeterminação fez a verdade fugir envergonhada e desnuda do mundo contemporâneo entregando-nos a nós mesmos; fato que mais me preocupa.
Nunca se falou tanto de cultura, perspectiva cultural e interculturalidade. Cultura é a palavra que define o mundo atual e não poderia ser diferente, ela é o reino do relativo e do volátil, ela admite todos os tipos de arranjo, de conexões, ninguém sabe de fato o que ela é ou deixa de ser, o que abrange ou deixa de abranger.
Quanto à religião, disse Baudrilhard, antigamente Deus e o Diabo lutavam por nossas almas bem acima das nossas cabeças. E agora o que nos resta? Quem luta por nós? Mundo estranho e melancólico este desprovido das entidades metafísicas e sobrenaturais que povoaram as visões de Blake (é o admirável mundo novo).
Quanto à natureza, comparo-a a um ser humano perturbado psiquicamente. Você percebeu que o clima está se comportando de forma bipolar? As estações estão se misturando, as divisões climáticas não mais existem, as fronteiras sumiram nas uniões aduaneiras, nas perspectivas intertextuais e também no clima.
A chuva cai torrencialmente lá fora e aqui dentro... Calor insuportável (uma palavra para definir tudo I N D E F I N I Ç Ã O). Parem o mundo que eu quero descer, sinto-me entorpecido, embriagado, com ânsia de vômito, confuso, tripulante de um rodopiante carrossel...
Você já percebeu que o céu a noite ficou estranho, vermelho, como se estivesse pegando fogo, com “cara de zangado? (estaria o altíssimo com raiva dos reles mortais?)”. Espero que não; expulsamos Deus do mundo, mas nunca ganhamos definitivamente a batalha contra ele porque ele está em nós, mora dentro da gente.
Estaria a história perto do seu fim? Será o Apocalipse às portas? Creio que não. Mas uma coisa eu sei: de agora em diante o mundo será dos mais aptos (é Darwin ressuscitado), dos excessivamente práticos, dos consultores intransigentes que amam o egoísmo como se fosse uma virtude.
A procissão humana e penitente rumo ao futuro já se pôs em movimento e em cada estação uma surpresa, um martírio, uma prova de fogo. São os passos, não os do Cristo do Aleijadinho, mas da própria humanidade cambaleante e desnorteada que transita ensanguentada por sua própria via crucis na esperança de está cumprindo uma obra redentora.
É bom, porém, lembrar que nem todos poderão seguir em frente; o discurso comunitário global é mais uma artimanha dos donos do poder que estão cada vez mais ocultos por trás da fluidez e indefinição de todas as coisas. É isso mesmo, nem todos irão seguir em frente, os bolsões de pobreza, depósitos pra guardar João-Ninguém, se multiplicam todos os dias.
Estamos assustados, apreensivos e com cara de choro exatamente porque estamos nos despedindo da estufa que nos acolheu nos primeiros momentos de vida e deixando para trás os que ficarão enquanto caminhamos resolutos sem saber pra onde, mas na esperança de encontrar o futuro e nos congratular com ele na próxima esquina.

André Pessoa

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