UMA IGREJA DESESPERADA

UMA IGREJA DESESPERADA

A Igreja Católica Apostólica Romana sempre foi a prova viva de que religião, política e poder sempre andam de mãos dadas. O mundo medieval, dominado inteiramente pelo catolicismo, impôs o “poder espiritual” sobre o poder temporal.
Multiplicaram-se no período em questão as querelas entre imperadores e papas. Os conflitos giravam principalmente em torno da investidura dos bispos. Monarcas e pontífices requeriam para si o direito de nomeá-los.
O maior símbolo da Igreja Católica nesse tempo foi o Tribunal do Santo Ofício, conhecido nos meios populares como inquisição. A inquisição ficou conhecida em todo o mundo pelas suas práticas violentas em países como Espanha e Portugal durante os séculos XV e XVI.
Entretanto, o mundo começou a mudar durante o século XX e o poder do catolicismo abalado pela modernidade tornou-se mais maleável. O Concílio Vaticano II, convocado por João XXIII e presidido depois por Paulo VI, tentou dar uma nova roupagem ao culto católico promovendo uma maior participação dos leigos.
A partir de então os tempos de glória do catolicismo começaram a dar indícios de que chegariam ao fim; embora saibamos que uma religião originária do século IV e com tanta história demore a se render. As mudanças de paradigma atropelaram o catolicismo e o restante das religiões tradicionais do mundo!
O mundo mudou, as pessoas mudaram, a mentalidade mudou e os dogmas católicos tornaram-se incompatíveis com os tempos atuais. O sexo apenas para a procriação e dentro do casamento, o não uso de preservativos e o dogma da infalibilidade papal não se sustentam mais nos nossos dias.
As pessoas desse início de século XXI não gostam de mandamentos, mas apenas de sugestões (David Fischer). A moral católica cristã deixou de ser um parâmetro norteador da sociedade e as pessoas não rezam mais antes das refeições (o máximo que fazem é se benzer quando entram no mar!).
Mesmo o movimento carismático brasileiro encabeçado pelo padre Marcelo Rossi e outra figuras midiáticas conseguirá reverter esse quadro, inclusive por não ser muito festejado pela ala mais conservadora da igreja romana. Entre conflitos internos e externos arqueja o catolicismo!
As crianças brasileiras, por exemplo, não mais cultivam o hábito de “tomar a benção” aos pais e as igrejas católicas na Europa (assim como as protestantes também) estão esvaziadas. Religião na Europa virou prática apenas de imigrante africano e latino vítima de preconceito.
Os templos estão fechando e sendo vendidos a livrarias e restaurantes por toda a Europa. Muitas pessoas continuam querendo Deus, mas não suportam mais o peso da religião e dos seus dogmas que em muitos casos não passam de convenções meramente institucionais que nada têm que ver com os fiéis e com o Cristo.
No Brasil, o desespero do catolicismo em franca e silenciosa decadência se expressou em dois acontecimentos articulados pela própria cúpula católica como reação a perda de espaço na Europa. Refiro-me a ordenação do primeiro cardeal católico Latino-americano e a Jornada Mundial da Juventude em 2013.
O catolicismo, abalado pela perda de fiéis em todo o mundo, resolveu dá uma atenção especial aos países onde ainda existem pessoas engajadas no culto católico, o Brasil é um desses países. A nomeação de João Braz de Aviz para cardeal é um símbolo dessa nova situação e das manobras católicas.
Parece até uma piada que a Igreja Católica Apostólica Romana nomeie um cardeal latino-americano e, como se isso não bastasse, definido pelo Vaticano como adepto da Teologia da Libertação. Se bem que essa Teologia já foi enterrada com a queda do Muro de Berlim em 1989 e o fim da guerra fria.
O problema da religião é que ela subestima a inteligência dos fiéis que à medida que vão se emancipando dos dogmas religiosos deixam também de prestar obediência à igreja. Mesmo o mais humilde dos crentes um dia percebe o que está por trás do jogo religioso!
A América Latina e tudo o que vem dela sempre foi preterido pelo catolicismo romano. Homens como Leonardo Boff foram perseguidos e excomungados da igreja sem nenhuma piedade por causa das suas posições consideradas “avançadas”. "Avançado", para a cúpula católica, é tudo que não consta nos credos.
Seria inocência acreditar que a Igreja Católica está agora nomeando de boa fé um cardeal latino-americano e adepto da Teologia da Libertação? Como se tudo isso não bastasse, o cardeal João Braz de Aviz, em sua primeira entrevista, convidou os colegas clérigos europeus a “descerem do pedestal e reconhecerem que o mundo mudou”.
É óbvio que tudo isso se trata de uma manobra política de uma igreja desesperada e cônscia de sua péssima situação no mundo e que tenta remediá-la com um ato politicamente pensado, mas a meu ver, que terá pouca eficiência. Tudo está no script!
O que passou, passou! Nem os tempos gloriosos do catolicismo e nem de qualquer outra religião voltam mais. Nem todos os santos e a autoridade de todos os papas são capazes de perpetrar tal milagre!
A Igreja Católica pretende também reunir dois milhões de jovens na Jornada Mundial da Juventude em 2013, logo depois da Copa das Confederações, no Rio de Janeiro. O evento provavelmente será o maior da cidade do Rio nos últimos anos.
Entretanto, nem mesmo um evento de tamanha dimensão é indicativo de que a igreja conseguirá reverter a sua difícil situação. Os eventos intermitentes não servem para aferir em que estado a igreja se encontra.
Os sintomas da decadência da religião estão em toda parte e um encontro religioso de massa, por maior que seja não muda isso. O mundo e o Brasil caminham para o laicismo e essa marcha é irreversível.
O catolicismo romano vem a muito sendo corroído lentamente desde que esqueceu que o reino de Deus não consiste em política e agressividade. O cristianismo esqueceu-se de ser cristão e por isso pagará o preço do seu esquecimento.
Aqueles que se apressaram em dizer que Freud havia errado em seus prognósticos sobre a religião, chamada por ele de neurose da humanidade, se equivocaram. Começo a acreditar que Freud está vivo, mas a religião está morrendo.

André Pessoa