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domingo, 17 de outubro de 2010

DEICIDA



DEICIDA


Embora eu seja de peixes, gosto mesmo é do fogo. Adoro dançar entre as chamas, perpetrar atos sacrílegos, jogar pedra na cruz (não no crucificado), zombar com ironia do mais terno ritual, desdenhar dos catequistas...
Penso que fui possuído por mil demônios, entre os quais o espírito de Rimbaud. Como àquele, às vezes desejo ir embora pra bem longe, pra longe das convenções, das mesquinharias que julgamos ser ouro, dos credos mecânicos e vazios, dos casais que de tão felizes estão agora mesmo apodrecendo por dentro, apesar de tamanha “felicidade”.
Rio do céu e dos seus anjos bochechudos, morro de tanto rir do inferno, a pátria do diabo e do enxofre. Um e outro nada significa para mim. O primeiro pela monotonia e o segundo pela infâmia pueril. Ah, ia esquecendo, também não gosto dos santos; queria vê-los mortos se já não estivessem nesta condição!
Pra falar a verdade, eu sou um deicida. Matei deus numa manhã de domingo, depois do culto (se você quiser pode chamar de missa), antes do almoço para não ter indigestão. Não se deve brincar com a falsa idéia de Deus criada pela religião, isso faz muito mal, dá náuseas, para usar uma palavra sartreana.
Sinto-me enojado com a hipocrisia da religião. Além de Rimbaud, Nietzsche também ressurgiu em mim, sobretudo, nas minhas palavras, nos meus aforismos. Sinto-me enojado com o verniz pegajoso e superficial com o qual o cristianismo pintou o mundo e envenena todas as coisas. Sou o ocaso da fé, o derradeiro suspiro do sobrenatural, sou o grau mais baixo, embora refinado da descrença.
Se Deus existe, e acho que ele existe, a religião é uma farsa, uma mentira. Se a religião for verdadeira Deus é que não existe e está morto. Ambos são incompatíveis: ou somos religiosos ou cremos em Deus; crença na religião e fé em Deus não podem existir lado a lado.
A doçura do cristianismo gera diabete espiritual. A verdade é dura e rústica, embora verdadeira. O cristianismo é doce e delicado, mas mentiroso. A insossa verdade ou a doce mentira? O que você vai escolher?
Fico nauseado com tudo o que é sentimental; algo meio punk não acha? Por outro lado, sei que não existo para desconstruir nada. O mundo não precisa de minha ajuda para desmoronar. Já está caindo, desabando, indo ao chão agora mesmo. É melhor sair de baixo!

André Pessoa

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