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quarta-feira, 28 de julho de 2010

DE CABRAL A STALLONE



DE CABRAL A STALLONE


O ator Silvéster Stallone que esteve recentemente no Brasil para gravar o longa metragem “Os mercenários” desencadeou uma verdadeira campanha contra ele no twitter ao fazer declarações consideradas politicamente incorretas de caráter sarcástico e humorístico acerca do nosso querido país.
Entre outras coisas, o lendário Rock-Rambo afirmou numa feira de cultura na Califórnia que resolveu filmar no Brasil porque aqui é possível machucar as pessoas durante a filmagem sem nenhum ônus. E olha que nos filmes dele as pessoas se machucam mesmo, principalmente se forem vietnamitas ou russas.
Além disso, ridicularizou o BOPE (Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro) por causa da insígnia onde uma caveira aparece transpassada por punhais e concluiu dizendo que aqui você pode explodir o país inteiro e nós agradecemos e ainda oferecemos um macaco para o visitante levar de presente.
Entretanto, não vá achando que a culpa por estas declarações preconceituosas e humilhantes é somente desse ator de meia tigela norte-americano. Nós temos a nossa parcela de contribuição nisso. Aliás, fomos nós mesmos que ajudamos a construir esta imagem distorcida do nosso país lá fora ao longo da nossa história de colônia bem comportada e submissa.
Por trás das declarações de Stallone, esse solitário vingador norte-americano da vergonha ianque no Vietnã, está um modelo que há muito tempo foi construído pelos colonizadores e aceito docilmente pelo nosso país: trata-se da idéia de que somos um país exótico e passivo.
Antes mesmo que os primeiros navegantes chegassem às nossas terras nos séculos XV e XVI já havia boatos na Europa acerca de uma “Ilha Feliz” pras bandas de cá. E era feliz até demais, pois Gilberto Freyre afirma que as índias brasileiras receberam os portugueses não apenas de braços abertos, mas também de pernas abertas.
Somos fruto de um saque, de um roubo, e os colonizadores, além de nos roubar, também vieram aqui nos desmoralizar. E o pior, nós aceitamos isso porque ficamos maravilhados com a pele branca e os olhos azuis dos estrangeiros que viam a colônia brasileira apenas como um depósito de proscritos cheio de insetos nocivos e doenças tropicais perniciosas.
As intenções dos colonizadores estrangeiros estavam já muito claras na primeira carta de Pero Vaz de Caminha ao rei de portugal, pois esse tarado escrivão passa metade da sua histórica missiva falando das “vergonhas das índias” e do exotismo de nossa terra na qual “em se plantando tudo dá”.
O tempo passou, a história avançou e a tônica continuou a mesma. No século XIX, uma grande quantidade de viajantes europeus veio ao Brasil para retratar e documentar a nossa exuberância natural através de escritos e pinturas que chegavam à Europa e despertavam o interesse daqueles em relação aos “exóticos selvagens brasileiros”.
Alguns desses viajantes europeus que estiveram no Brasil no século XIX escreviam em tom preconceituoso que nos nossos portos os “negros brasileiros” emitiam sons horríveis enquanto trabalhavam carregando os navios que iam para a Europa. Como resposta a essa atitude, mesmo muitos anos depois destes fatos, continuamos nos esforçando e até fazendo mímicas para nos comunicar com um povo que sempre nos olhou “de cima para baixo” e lotando os cinemas para assistir os muitos Rambos.
Em troca da nossa camaradagem e da acolhida que receberam no Brasil, os povos estrangeiros, sobretudo, europeus e americanos, nos presentearam com o título de grande exportador de gêneros agrícolas na DIT enquanto eles se arrogavam a condição de produtores de tecnologia. Assim, a banana acabou sendo derrotada pelo microchip!
As declarações absurdas de Silvéster Stallone provam que “mudaram as estações, mas nada mudou”. Continuamos sendo vistos lá fora como povos primitivos que vivem dentro das matas e dão macacos de presente aos visitantes. E fomos nós que construímos esta imagem exportando mulatas com Sargentelli e anunciando em alto e bom som que nós éramos “o país do carnaval”.
Nosso país é considerado pelos europeus e norte-americanos uma espécie de “cabaré do mundo” ou “bordel do hemisfério sul”. Para esses indivíduos que ainda levarão muito tempo para nos olhar como pessoas dignas e nos tratar como tais nos desembarques em seus aeroportos, o Brasil é somente uma colônia de férias onde todos os limites desapareceram ou um bom lugar para fazer turismo sexual.
Chega de ouvir estes comentários absurdos acerca do país que tanto amamos. Devemos nos unir e construir outra imagem do nosso país lá fora. Uma imagem que, embora não despreze o futebol e o carnaval, esteja mais vinculada aquilo que está escrito em nossa bela bandeira: ORDEM E PROGRESSO! É hora de substituir a chuteira e a fantasia pelo cumprimento das leis e pelos livros.

André Pessoa

3 comentários:

  1. Vamos de fantasia, vamos de chuteira, mas vamos precisar de outras "armas" também, para, pelo menos, termos chance nessa batalha hérculea. Os livros sempre bons alidaos podem se juntar aos microchips e até as bananas. Somos um todo complexo que precisa urgentemente dizer não à esta imagem estereotipada, ao mito da homogenea identidade nacional. Vamos usar e abusar desse potencial múltiplo, das várias faces desse corpo-nação que somos para fazer os ventos soprarem a nosso favor. Eu voto sim a essa mudança. Que imagem temos de nós mesmos, que imagem queremos cosntruir e o que estamos fazendo para isso? Me parecem questões interessantes pra começar a conversa. Ei, cuidado, em época de eleição, alguns candidatos podem querer plagiar teu texto. Se for possível, não permita, por favor.

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  2. professor, acho seus textos incríveis. discordo de bastante coisa, mas muitos deles são muito bons, bem fundamentados e me fazem olhar a vida com outros olhos. parabéns pelo seu trabalho!

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  3. Parabéns pelo seu trabalho!²
    Realmente, os seus textos são muito bons e nos fazem olhar mais criticamente para as coisas ao nosso redor, deixando de ser observadores passivos.

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