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sábado, 24 de julho de 2010

O "GRANDE PRÊMIO"



O “GRANDE PRÊMIO”


Recebi a notícia com muita alegria, afinal de contas eu nunca havia sido sorteado em coisa alguma. Em geral, as únicas coisas que eu recebo em casa são extratos e contas a pagar; prêmios, brindes, heranças ou coisas do gênero nem pensar.
Lembrei que uma semana antes, enquanto eu comia num restaurante chinês, uma dessas promotoras com cara de pecadora me fez preencher o cupom de uma promoção que até me ligarem ontem eu não sabia do que se tratava.
Do outro lado do telefone uma voz com timbre e sotaque de atendente de telemarketing me comunicou que eu havia sido agraciado com uma hospedagem em qualquer um dos hotéis da rede B... para um final de semana numa das unidades espalhadas por todo o nordeste a minha escolha.
Em minha persistente inocência fiquei feliz e comecei a fazer planos para um ótimo final de semana. Só faltavam alguns dias para o fim das minhas férias e o lugar mais longe que eu tinha ido foi à padaria da esquina para comprar pão. Então pensei comigo: “As coisas estão mudando, a sorte começou a bater em minha porta. Até em sorteio eu estou ganhando”.
Bom, agora só faltava escolher a acompanhante. Pensei em pessoas da família, pessoas íntimas que não são familiares e em pessoas muito íntimas que caso fossem familiares eu estaria envolvido num caso de incesto.
De repente um insight, um estalo, aquilo que as pessoas chamam de “ficha caindo”. Pensei comigo: “será que a promoção inclui também as passagens e pelo menos uma parte do consumo no hotel durante a estadia?”.
Liguei para o número que me foi fornecido pela pessoa que me ligou dando “a grande notícia” e então descobri que tudo continuava como antes e que a mudança da minha sorte será o resultado do meu esforço e não da benevolência de quem quer que seja, muito menos de uma “extraordinária e maravilhosa” rede de hotéis (eu já sabia).
“Por favor, minha filha, me tira uma dúvida”, eu disse depois que a moça atendeu ao telefone. “As passagens e o consumo durante a estadia estão inclusos no prêmio promocional?”. Antes que eu terminasse de falar, o robô, quero dizer a atendente, respondeu em tom quase ríspido: “De forma alguma senhor, somente a hospedagem no sábado e no domingo”.
“Ah, entendi. Então, nesse caso, vá você no meu lugar e boa viagem!”. Desliguei o telefone num misto de educação e desdém e pensei comigo mesmo: “interessante, uma esmola em forma de promoção”.
Toda vez que você ouvir a palavra promoção segure a carteira, chame a polícia ou esteja pronto para receber uma esmola de algum grupo empresarial que se acha perito em marketing e acredita que está lhe doando um tesouro incalculável quando na verdade está lhe oferecendo alguma porcaria.
Sabendo como estão caros os preços dos vôos domésticos e como são exorbitantes os valores de comidas e bebidas nos hotéis de 3, 5 ou uma constelação de estrelas, considerei imoral e ao mesmo tempo um atentado a minha inteligência e capacidade de calcular o custo-benefício das coisas o “grande prêmio” a mim oferecido.
Ao que tudo indica, certas empresas com as suas “promoções” idiotas subestimam a capacidade intelectual das pessoas. Se aquela rede de hotéis ridícula dependesse de mim para fazer propaganda com custo zero do seu negócio certamente iria à falência.
Oferecer apenas uma hospedagem de 48 horas (duas vezes Jack Bauer) a um suposto imbecil sorteado numa promoção de mentirinha é o mesmo que mandar a seguinte mensagem para o infeliz “ganhador”: “A nossa rede de hotéis suporta a sua desprezível presença em nossas instalações por dois dias, não mais que isso. Você não acha o máximo?”.
O que leva uma rede ridícula de hotéis a crer que uma pessoa de inteligência mediana vai acrescentar um custo não programado com passagem e alimentação a uma viagem também não programada para permanecer dois míseros dias “em uma das suas muitas unidades no nordeste?”. Será que estão pensando que eu sou algum retardado?
Eu posso até ser descuidado, mas imbecil jamais. Capitalismo selvagem!

André Pessoa

2 comentários:

  1. André, ainda bem que isso acontece com outras pessoas também. Eu, devido ao meu trabalho, conheci todas essas armações, mas vi colegas entusiasmados comparecerem às reuniões para receber o "prêmio". Alguns saíam frustrados, outros com um plano da rede de hoteis para uso anual, mediante uma taxa mensal. Me lembra também as ofertas das revistas em aeroportos. Voce ganha a revista, somente se fizer a assinatura. Mas o que vale é a diversão, como trabalhei em banco, eu aproveitava e tentava fazer uma venda "casada". E dizia, se voce fizer uma capitalização ou previdência, eu participo do seu plano. Engraçado, ninguém aceitava.
    Allis

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  2. É Prof. André, quando é para roubar a sua grana as pessoas inventam de tudo para lhe passar a perna. Em meio a sua postagem lembro de minha vó, que perdeu 20,00 R$ estrategicamente planejado por uma nota falsa de 100,00 R$.
    Ela estava em sua casa, quando um homem vem em seu terraço dizensdo-lhe ser amigo dos netos dela. E que estava devendo 80 para um deles. O homem ao explicar o porque estava ali pediu-lhe com simplicidade 20 para dar de troco para ele, e que apenas poosuia 100. Então o homem foi embora. E quando seu neto chega, Ele e a minha vó viram que era uma nota falsa. Resumindo, hoje em dia alguém lhe dar uma nota de 100, a pessoa arregala os olhos e aceita. Uma boa estratégia para pegar um mísero 20 reias. ¬¬

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