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sexta-feira, 17 de junho de 2011

A CRIANÇA








A CRIANÇA


Quero começar este texto fazendo uma confissão: eu nunca fui muito popular entre as crianças. Elas sempre me olharam com certa desconfiança, me acham muito sério e choram por causa dos meus óculos.
Com raras exceções, a reação de todas elas é sempre a mesma: primeiro olham desconfiadas, depois fazem o tradicional biquinho e por fim choram. Meu semblante carregado de preocupações existenciais não combina com os sonhos de criança e os meus olhos atentos examinando-as demoradamente parecem incomodá-las.
Embora nunca use desse expediente (é óbvio), percebi que possuo o “poder” de fazê-las chorar com um simples olhar. Acho que tenho aspecto de lobo-mau, ogro ou qualquer outra coisa do gênero.
Em muitos casos as crianças que me olham, correm para os braços das mães e se agarram às pernas maternas amedrontadas. E pensar que com Jesus Cristo acontecia exatamente o contrário. Seria eu uma espécie de diabo? KKK.
Apesar do meu insucesso com os pequeninos e do medo infundado que nutrem de mim, fico maravilhado com a pureza inocente demonstrada por algumas crianças. O desinteresse delas por números, como observou Saint-Exupérry, e os seus sorrisos me conforta!
Dois dias atrás, quando estava estacionando o meu carro próximo ao local de trabalho, vi uma linda criança que despertou os meus mais ternos sentimentos (se é que ainda existem em mim). Ela é a filhinha do flanelinha da área onde estaciono o meu automóvel.
Desde a primeira vez que vi aquela criançinha brincando na calçada fétida, enquanto o seu pai tomava conta dos carros estacionados ao longo da rua, me emocionei. Tive uma súbita vontade de dar-lhe tudo aquilo que estivesse ao meu alcance e que a pudesse fazê-la feliz. Eu queria vê-la sorrindo.
Dei-lhe primeiro um pacote de biscoitos, noutro dia uma maçã, em seguida uma laranja e estou pensando seriamente em comprar-lhe uma boneca. Não sei exatamente porque, mas sinto-me compungido a presenteá-la compulsivamente.
Talvez porque aquele olhar puro e terno misturado com o sorriso inocente que vislumbrei em seu rostinho pequeno tenha sido igualmente um presente para mim. As crianças são presentes para um mundo mergulhado na maldade e na miséria das tramas adultas!
O que mais admirei naquela criança, que mal sabia andar, foi o seu sorriso lindo, mesmo ali sentada naquela calçada nojenta e áspera em meio a uma cidade neurótica e egoísta. Ela consegue sorrir mesmo em meio à “selva de pedra” e ainda que esteja em um lugar insalubre e quente próximo a um esgoto.
Aquela menininha não conhece ainda o mundo (e quem dera nunca conhecesse) e por isso sorri. Ela faz uma grande festa por causa de uma simples laranja recebida da mãe enquanto tantos não se contentam com toda a riqueza do mundo. Ela é o que todo adulto em certo sentido deveria ser: criança.


André Pessoa

3 comentários:

  1. UM PROFESSOR MIESERAVE DESSE TEM CARRO ???!

    É USADO, NÉ ?

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  2. Prof, gostei muito do texto, é realmente muito bonita inocencia da criança... inocencia essa que existe apenas porque a mesma ainda não conhece o mundo. Rousseau diz que "O homem nasce puro e sociedade o corrompe". Frase sábia dita pelo filosofo iluminista que a cada dia faz mais sentido. Penso eu que o brilho do olhar de uma criança da-se principalmente por ela não ter enfrentado as atrocidades desse mundo, ou no caso da que você citou, por ser filha de um flanelinha e está nas piores condições, ela consegue ver beleza nas menores coisas, nos menores gestos está para ela as maiores coisas, porém ela não viu ainda o abismo que a distancia das outras crianças de classe alta e quando isso acontecer, talvez, se a mesma não tiver uma base familiar sólida e estruturada e uma cabeça bem formada (que, infelizmente, provavelmente não vá ter), ao se deparar com a realidade e desigualdade existente no mundo, a sua inocencia e o seu brilho nos olhos seram substituidos por sentimentos menos nobres como inveja e insegurança. Esse fato me remete a discussoes que ja presenciei, le e/ou ouvi sobre os furtos dos adolescentes pobres de hoje em dia estarem relacionados não porque eles precisam do dinheiro, porque eles não roubam para se sustentar, e sim para ter o tenis parecido com o rico, ou o celular, ou seja lá o objeto do mometo. Seria esse o futuro desgraçado que espera essa criança? Sinceramente, torço para que não... apesar de que a realidade seja bem diferente.

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  3. Parabéns pelo sentimento nobre que ainda existe em você!

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