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sábado, 31 de julho de 2010

VOCÊ ACREDITA EM DEUS?




VOCÊ ACREDITA EM DEUS?



No último dia 27 de julho, o polêmico Datena, apresentador de um programa policial de grande audiência na TV, afirmou ao vivo que o aumento de crimes hediondos cujos protagonistas demonstravam excessiva frieza na hora de praticá-los era um resultado da incredulidade das pessoas em relação à existência de Deus.
Afirmou que os ateus não possuem limites e que o ateísmo gera violência. Indiretamente (ou melhor, diretamente) sugeriu que a crença em Deus tinha como conseqüência o bem da sociedade e a diminuição dos crimes e conclamou os telespectadores a participarem de uma pesquisa interativa na qual diziam se acreditavam ou não em Deus.
Não achando tudo isso suficiente afirmou que não fazia a menor questão que ateus assistissem ao seu programa e incentivou uma participação em massa dos “crédulos” para derrotarem o mal dando uma “lavagem” na pesquisa interativa que a essa altura já havia sido iniciada e cujos números apareciam na tela da TV.
As palavras de Datena, embora pareçam proceder de um coração quase “santo”, a mim cheiraram a hipocrisia e moralismo. Elas estavam carregadas de um preconceito velado disfarçado de piedade religiosa que eu conheço de “outros carnavais”. Os moralistas portadores de discursos vazios sempre parecem convincentes aos olhos do senso comum.
Datena falou com a mesma arrogância dos antigos inquisidores que tanto mal fizeram a humanidade no passado. Além disso, desrespeitou a liberdade que as pessoas possuem, inclusive prevista na constituição, de professarem as suas crenças ou descrenças religiosas desde que estas não afetem o bom funcionamento da sociedade. Esqueceram de dizer a ele que as pessoas têm direito de não crerem e isso não as torna marginais inclinadas a atos violentos.
Ele esqueceu que nós estamos num país laico onde as pessoas podem expor abertamente as suas posições religiosas sem serem constrangidas a mudá-las por quem quer que seja. Foi vergonhoso o uso que esse cidadão fez da TV (que deveria ser por natureza um veículo de manutenção das liberdades particulares e coletivas) como um instrumento para propagar uma mensagem religiosa preconceituosa que, se a minha intuição não me engana, não passou de uma farsa para atrair a simpatia dos influenciáveis.
Amigo Datena, depois de eu ter estudado teologia exaustivamente e conhecer a história de vários grupos religiosos cheguei à conclusão de que amor ao próximo e comportamento essencialmente humano nem sempre está ligado à crença religiosa. Existem religiosos que não valem um tostão e ateus que embora não admitam vínculos com crenças religiosas amam o semelhante e contribuem para o bem da humanidade.
Basta olhar retrospectivamente para a história para ver os muitos desmandos que já foram cometidos em nome de Deus. É bom lembrar que a mera confissão verbal nada vale quando se vive totalmente alheio aos princípios que se acreditam vinculados a ela. Palavras que não são acompanhadas por atitudes nada significam!
Revendo a minha vida pessoal e a história da humanidade concluo, com certa tristeza, que as pessoas que mais me fizeram mal e que cometeram muitos crimes brutais contra o ser humano, em muitos caos, eram pessoas que diziam acreditar em Deus e que seguiam alguma confissão religiosa. Lembra das cruzadas amigo Datena? Já ouviu falar em fundamentalismo religioso? E em inquisição? E em exploração de fiéis através de igrejas mal intencionadas?
Pois é, como diz os evangelhos “nem todo que diz Senhor, Senhor, herdará o reino dos céus”. Como bem observou Soren Kierkegaard em algum lugar, aquele que se prostra perante um ídolo (ainda que seja o próprio ego ou a descrença), às vezes está sendo mais sincero do que muitos religiosos que com as suas atitudes e preconceitos mesquinhos acabam desdenhando do sobrenatural. Fé de boca é fé oca!
O assassino, amigo Datena, não é alguém descomprometido com uma crença religiosa e sim alguém descomprometido com a vida e com a maravilhosa singularidade do ser humano. A violência é o recurso dos fracos e não dos descrentes. Quem mata, pode até continuar acreditando em Deus, mas há muito deixou de acreditar na vida!

André Pessoa

2 comentários:

  1. Eu assisti a esse programa. Infeliz o pobre Datena. Infeliz não pelo que ele falou, mas pelo programa de baixo nível, apelativo, que explora as mazelas humanas para uso próprio. Esquece ele que não é o dono da verdade.
    Me lembro da puxada de saco no caso da morte do filho da Cissa Guimarães. Ridículo. Mas eu aproveito para fazer uma pergunta: O que alguém estava fazendo às 2:30 h da madrugada, andando de esqueite em um túnel em manutenção? Um erro não justifica o outro, mas não dá permissão a ninguém inferir uma acusão sem conhecimento de causa.
    Mais uma vez, nota 10 para o texto.

    Allis

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  2. Criminoso devia ser quem faz esse tipo de uso da TV. Infeliz pelo programa, infeliz pelo que disse e como fez...Datena. Eu não vi esse absurdo, mas conheço bem o estilo, infelizmente tão comum. As religiões e crenças deveriam servir para melhorar o ser humano, não é? Quantos crimes já vimos ser cometidos em nome de Deus e quantos ainda vamos ver? Prefiro os ateus aos hipócritas..."Suas ideias não correspondem aos fatos" - que triste e acertada previsão de Cazuza. Ainda bem que existe a internet e blogs como esse pra gente não deixar esses absurdos passarem em branco. Pelo menos, podemos falar, usufruir da liberdade de expressão...ainda que tenhamos consciência de que tal liberdade é relativa e condicional.

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